Pesquisa

Inversão de fator de qualidade Q

A atenuação e dispersão do sinal sísmico têm atraído a atenção dos geofísicos da área de petróleo, que têm buscado técnicas para melhor estimar parâmetros, em particular o fator de qualidade Q, que possam caracterizar adequadamente este fenômeno (Castagna et al. 2003, Silin et al. 2006). As razões deste interesse são principalmente: (i) aumentar a qualidade do imageamento sísmico, uma vez que um melhor conhecimento dos parâmetros de atenuação contribui para melhorar o produto final do processamento sísmico (Pramanik et al. 2000), e (ii) os parâmetros de atenuação, em particular o fator de qualidade Q, têm um grande potencial de uso como indicador de hidrocarbonetos (DHI) na rocha-reservatório (Odebeatu et al. 2006, Dvorkin & Mavko, 2006).

As teorias sobre atenuação utilizam um fato empírico fundamental: as ondas elásticas não são atenuadas em rochas muito secas (Klimentos 1995). Desta forma a perda de amplitude é usualmente ligada à energia perdida no fluxo oscilatório do poro-fluido provocado pela passagem da onda. Parte da energia é transformada em calor devido à fricção do fluxo viscoso. Este fluxo pode ser especialmente forte em rochas parcialmente saturadas em que a fase fluida viscosa (água) se move para dentro e para fora do espaço poroso saturado de gás (Dvorkin & Mavko 2006). Estas perdas por fricção viscosa podem ocorrer também em rochas completamente saturadas onde heterogeneidades elásticas estão presentes. Deformações devido à onda de stress são relativamente fortes na porção menos rígida da rocha e mais fracas na porção mais rígida. Como resultado destas forças não equilibradas, o fluido flui das porções menos rígidas para as mais rígidas. Este acoplamento hidromecânico dependente de freqüência pode ocorrer em todas as escalas espaciais (Jonscher 1999, Brouers & Sotolongo-Costa 2005, Carcione & Picotti 2006). O squirt-flow microscópico se desenvolve em escala submilimétrica, pois os espaços porosos incluem formas equidimensionais de porções rígidas e frágeis. O squirt-flow macroscópico, que é relevante para o experimento sísmico de campo, ocorre devido a heterogeneidades de larga escala na rocha. Este mecanismo recebeu recentemente um tratamento matemático rigoroso no modelo de dupla-porosidade (Pride et al. 2003, Pride & Berryman 2003a,b).

No entanto, a aplicação prática destas teorias é impedida pela dependência, inevitável, de variáveis que não estão normalmente disponíveis (como a permeabilidade) ou simplesmente não são mensuráveis, como o raio de squirt-flow ou a escala da heterogeneidade elástica macroscópica. Todavia, já foi demonstrado que a abordagem macroscópica de caracterizar a atenuação via modelos baseados no fator de qualidade Q incorpora fenômenos de dispersão que ocorrem em várias escalas e podem ser descritos por uma lei de escala com um único expoente de universalidade (Brouers & Sotolongo-Costa 2005). Por este motivo técnicas de inversão de fator de qualidade baseadas em dados de campo (macroscópicas) são importantes (Dvorkin & Mavko 2006).

As técnicas para estimação de Q podem ser separadas em dois grandes grupos (Tonn 1991): aquelas que utilizam a informação do pulso no domínio do tempo e aquelas que utilizam a informação do pulso no domínio da freqüência. Tonn (1991) realizou uma análise comparativa entre as técnicas. De acordo com este autor, para o primeiro grupo, a técnica de Engelhard (1990), que faz uso do sinal analítico, é a mais eficiente. Contudo, ela tem a forte deficiência de exigir o conhecimento da amplitude verdadeira do pulso. Por outro lado, para o segundo grupo, a técnica mais eficiente é a do modelamento espectral, embora a mais largamente utilizada, pela sua simplicidade, seja a do método da razão espectral. Contudo, esta última técnica não é eficiente na presença de ruído (Tonn 1991), o que é um fator fortemente limitante para aplicações em dados reais.

Recentemente, o grupo da UFRN (Moreira, 2006) desenvolveu uma abordagem de inversão de fator de qualidade que une as vantagens das técnicas do domínio do tempo com as vantagens das técnicas do domínio de freqüência. Tal união foi possível graças ao uso combinado da transformada S (Stockwell et al. 1996) e dos resultados de Quan & Harris (1997) sobre o efeito da dispersão no centróide de freqüência. O uso da transformada S permite efetuar um monitoramento da evolução temporal do espectro do pulso ao longo do tempo. Por sua vez, os resultados de Quan & Harris (1997) demonstram que a propagação do pulso no meio dispersivo provoca um deslocamento do centróide de freqüência, que é proporcional ao caminho percorrido pelo raio no meio.

A abordagem em estudo na UFRN para inversão do fator de qualidade é bastante robusta à presença de ruído e prescinde do conhecimento do campo de velocidade, não requerendo o ajuste da forma e amplitude do sinal. Neste sentido, esta técnica, tem grande potencial de aplicação. Todavia, o trabalho realizado até o momento enfocou basicamente a fundamentação teórica, trabalhando essencialmente com modelos de camadas planas e paralelas, deixando ainda um amplo espaço de investigação na questão de generalizar os modelos de inversão, bem como de investigar o seu efetivo potencial de aplicação em dados sísmicos de reservatórios, especialmente em dados de tomografia e de VSP. É necessário também realizar uma análise comparando seu desempenho, com outras técnicas promissoras propostas na literatura.

Esta linha de pesquisa conta com o apoio do CNPq e, no âmbito do INGP, esta linha de pesquisa será ampliada através da cooperação com os grupos da UFPA, UFBA e UNICAMP que têm bastante experiência na área de modelagem. Espera-se ainda obter condições de interagir com o grupo da Universidade de Praga, atualmente uma das instituições líderes no mundo na área de modelagem de dados sísmicos.